Em 2013 eu fazia caminhadas. Caminhadas, não em ritmo de passeio
mas em passo acelerado. Acho que seria mais adequado dizer que eu caminhava em
ritmo de marcha. Não marcha no sentido atlético do termo, mas também não era
caminhar como alguns pessoas que vemos na rua que vão claramente a passear.
Recordo-me de que fazia essas caminhadas cerca de 3 a 5 vezes por
semana, muitas vezes pela manhã. Antes de ir para o trabalho, lá estava eu na
rua a percorrer os 6 km da volta à cidade de Lagos. Demorava cerca de 50
minutos a caminhar essa distância. Por vezes, ao fim de semana, quando tinha
mais tempo, podia aumentar a distância até aos 10 km. Era assim na primavera de
2013.
Tinha um amigo e colega de trabalho que, por essa altura, também
saía à rua, logo pela fresquinha, para o seu exercício matinal. Ele corria
cerca de 10 km, dia sim dia não. Recordo-me de um dia ter falado com ele,
termos trocado algumas impressões sobre as nossas corridas e caminhadas, e eu
lhe ter dito "correr para mim não, eu gosto é de caminhar".
Pois bem, o tempo foi passando e, chegados ao verão de 2013,
comecei a correr. Acho que foi uma "evolução" naturalíssima, do
género primeiro anda-se, depois corre-se e a seguir voa-se, estão a ver?
Recordo-me de que comecei a correr aos poucos pequenas distâncias,
no meio das caminhadas que fazia. Após algum tempo já saía para correr 4 ou 5
km, mas ainda não conseguia correr essa distância toda de uma assentada. Por
exemplo, era capaz de correr 5 km, mas tinha que parar umas 3 ou 4 vezes para
descansar e recuperar fôlego.
Certo dia, devíamos estar em finais de junho, princípios de julho,
lembro-me de ter chegado a casa após uma corrida matinal e ter dito assim à MJ "Amor, andar já não dá pica, correr é
que é. Experimenta e vais ver" ao que a MJ respondeu "correr para mim não, eu gosto é de
caminhar" (onde é que eu já tinha ouvido aquela frase?).
Nesse mesmo mês inscrevi-me para a Corrida do Tejo, que se ia
realizar a 15 de setembro. Seria a minha primeira corrida de 10 km.
Com esta corrida em mente, procurei preparar-me devidamente.
Comecei a procurar alguns sites sobre corrida e alguma informação sobre planos
de treino. Dei com o site Carlos
Fonseca - Atletismo e segui o plano de treino para atletas estreantes nas provas de 10
km. O plano tinha 6 semanas de treinos, portanto, 6 semanas antes do dia 15 de
setembro de 2013 comecei a cumprir com as distâncias e ritmos prescritos no
plano.
Tudo correu bem e o dia da minha primeira prova de 10 km acabou
por chegar. Lembro-me que, juntamente com a MJ (a minha cara-metade), apanhamos
o metro em Odivelas até ao Cais do Sodré e aí apanhamos o comboio até Algés. Lá
chegados, um amigo (o tal que corria 10 km pela manhã, dia sim dia não) tinha
as nossas camisolas/dorsais que teríamos de vestir.
Devidamente equipados, lá procuramos aquecer no meio daquela
imensidão de gente. Era o meu primeiro contacto "a sério" com o mundo
do atletismo de estrada, a corrida na sua vertente mais popular, e estava
deslumbrado com tudo o que me rodeava. Havia todo o tipo de gente: homens e
mulheres, brancos e negros, asiáticos e americanos, gente das mais variadas
proveniências, gente nova e gente em quem os anos notoriamente se faziam notar,
corredores individuais e grupos de corrida, gente para quem aquilo era muito
sério e outros cujo desígnio último parecia ser divertirem-se o mais possível,
uns trajados a rigor, alguns pintados, outros até mascarados, uns que iam
correr os 10 km o mais rápido que conseguissem, outros que apenas iam andar os
10 km sem qualquer preocupação de tempo, simplesmente desfrutando da marginal
naquela manhã de domingo. E eu ali estava, inebriado pela excitação de tudo
aquilo sentindo-me desde logo integrado naquele admirável mundo novo.
Recordo-me de que coexistia em mim um misto de assombro e alegria:
assombro, pois estava perante alguns corredores que conseguiam correr os 10 km em
menos de 35 minutos, alegria, pois sentia-me contagiado por aquelas pessoas que
riam, abraçavam-se e tiravam imensas fotografias, como se tudo isso fizesse
parte integrante da corrida.
Todas aquelas pessoas pareciam completamente à vontade com o facto
de irem correr 10 km daí a nada, como se já fizessem aquilo há imenso tempo. E
eu, como me iria sair na minha primeira corrida de 10 km? Esta corrida não era
apenas a minha primeira prova de 10 km, como era de facto a primeira vez que eu
ia correr esta distância. Portanto, acho que algum nervosismo era normal. Iria
conseguir chegar ao fim? Iria sentir-me sempre bem? Haveria muitas pessoas a
correrem mais do que eu?
Bem, nada melhor para dissipar o nervosismo numa corrida do que
começar a correr. O sinal de partida foi dado, os corredores da frente lá
desataram a correr como se não houvesse amanhã e dispararam a correr os 10 km
como se fossem correr apenas 1,5 km!
A multidão foi avançando e lá chegou a minha vez de cruzar a linha
de partida. O meu tempo tinha começado a contar, tinha 10 km para percorrer até
ao final. As pernas soltaram-se, a respiração acelerou e lá segui eu, movido
pela adrenalina daquele acontecimento único cujos detalhes ainda hoje recordo e
já lá vão quase 3 anos.
Nos primeiros 5 kms deixei-me levar pelo ritmo da multidão que
parecia puxar-me, como se o esforço não fosse necessário e eu apenas tivesse
que me deixar ir sem grande esforço e chegar à meta cheio de vitalidade e
contentíssimo por ter corrido 10 km pela primeira vez. Em breve, eu iria
perceber que não seria assim tão fácil.
A partir do 6º km, comecei a acusar algum cansaço. Afinal, talvez
não tivesse sido boa ideia ter andado a fazer slalom nos primeiros 1 ou 2 kms, a ultrapassar outros corredores
como se fosse apanhar um comboio já ali à frente ou como se estivesse a correr
para a urgência do hospital para salvar alguém…
Quase a chegar ao 8º km, olhei para o relógio que me indicava o
batimento cardíaco e verifiquei que estava com o bpm (batimento cardíaco por
minuto) por aí a cima, pensei que talvez fosse melhor abrandar um pouco. O bpm
baixava e eu recuperava um bocado do cansaço que começava a tomar conta de
mim.
Assim fiz e durante 1 km caminhei. E realmente senti, como seria
totalmente expectável, um abrandar significativo no ritmo cardíaco. Por outro
lado, os corredores passavam inclementemente por mim fazendo-me sentir que
quase estava parado.
Perto do 9º km recomecei a correr e aí foi passá-los que nem
tordos caídos: tinha recuperado fôlego, as pernas tinham descansado um pouco,
eu sentia-me atiçado por todos aqueles que me tinham passado e faltava apenas 1
km até ao final. Portanto, era dar tudo por tudo até ao final!
Nesta prova, por volta dos 9,3 km passa-se em frente à meta, mas
do outro lado da estrada. Eu ainda tinha que ir até à rotunda lá mais para a
frente e voltar para trás, para então terminar a prova. Seria falso da minha
parte se dissesse que este ponto não custou, porque custou: via imensa gente do
outro lado já a terminar, estava cansado e queria chegar ao fim, mas ainda tinha
aquele último pedaço para correr!
Bem, sem correr esses últimos 700 metros a prova não estaria terminada.
Tinha que os correr e o que tem de ser tem muita força: ver a meta também dá
uma certa pica de nos esforçarmos para chegarmos ao fim, portanto força nas
pernas que para a frente é que é caminho.
E lá cheguei por fim ao final da minha primeira corrida de 10 km
que consegui percorrer em 54 minutos e 53 segundos.
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